A Ingrata Função de fazer o Bem
Se você não tem com quem desabafar suas frustrações, suas angústias, suas raivas, suas indignações, escreva. Você será o seu melhor e único ouvinte.
É estranho viver em um mundo onde as pessoas precisam de apoio e companhia, mas não querem um amigo com dons terapêuticos e psicológicos. Querer ajudar um alguém no fundo do poço, seria como se declarássemos que somos superiores ou melhores que ele.
Dói, ofende, faz os sujeitos se sentirem mais miseráveis.
É interessante e ao mesmo tempo injusta tal visão, pois o que mais tento transparecer é que sou humana (com meus problemas), assim como todo mundo.
Mas se você é um(a) amigo(a) - ou pretende ser -, você não tem qualquer direito em dar apoio moral, conselhos, incentivos. Não. Para ser amigo você precisa ser um zero à esquerda, muito mais à esquerda do que a pessoa em questão.
Você tem que se achar um merda, um fracassado, um incompetente, um rejeitado, para ser aceito pelas pessoas. No entanto, caso você tenha um razoável amor próprio, você será humilhado por aquele que está tentando ajudar e ser amigo.
Pessoas não querem amigos para lhes puxarem para cima, mas querem amigos para fazerem companhia em seu mundinho decadente e sombrio.
Pessoas não querem se autoconhecer, se superar, se sentir importantes. Querem a piedade dos outros, sem que lhes digam o que seria melhor fazer para vencerem os desafios.
O mais irônico é que geralmente eu não julgo as dores, o sofrimento, as lástimas dos outros. Pelo contrário, tento me colocar no lugar deles, mesmo que eles estejam se vitimizando e culpando a vida. Afinal, quem nunca se vitimizou ou culpou a vida, que atire a primeira pedra.
Acho extremamente sem sentido criticar um vitimista, sendo que ele não está consciente do próprio vitimismo e das razões do sofrimento dele. Você compreender ao máximo a dor do próximo, faz com que ele se abra e vá aos poucos percebendo onde está se enganando.
Porém, muitas vezes, quando somos compreensivos, recebemos a reação inversa. Ao enaltecermos as qualidades não vistas pela pessoa, ela reagirá com desprezo, ódio, inveja e sarcasmo. Dizer que todos temos dons e potenciais, é dizer que todos temos responsabilidades... e isso ninguém quer.
É preferível ser visto como um fracasso humano, uma vítima do mundo, pois assim se terá a dó e a "simpatia" das pessoas. É preferível mãos passando em sua cabeça, do que você ter que assumir o seu papel e ser desprezado pela massa.
Sim, as pessoas em geral querem pertencer... querem ser aceitas... querem se adequar. Ser diferente custa caro. E ainda que tenhamos que ter contato com outros de forma saudável, o que a maioria quer é ser aceito pelo grupo.
Ninguém na verdade quer ser leão; mas sim, carneiros. O leão tem opinião própria; o carneiro quer fazer parte e concordar com a maioria.
Ter dotes de curador é ser extremamente solitário. Como terapeuta você não será procurado, já que ninguém quer olhar para dentro de si, encarar as feridas e trabalhar em sua cicatrização. Todos procuram uma fórmula mágica ou receitinha de bolo para solucionar os seus problemas. Eis o por quê do sucesso da indústria farmacêutica...
Como amigo(a) você será rechaçado(a) e humilhado(a) por se colocar no lugar de alguém e querer ver seus pontos positivos. Ironicamente será odiado(a) por mostrar que consegue enxergar os próprios pontos positivos, independente da desaprovação social. A inveja corrói os vitimistas por dentro, pois não conseguem se amar sem que tenham aprovação social.
Ser um bom e compreensivo ouvinte será solitário, porque nas horas em que você precisar de um ouvido, você terá até certo ponto... Pois ao passar os limites da impaciência das pessoas, você não terá com quem contar. Tudo o que disser será exagero ou perda de tempo. Nosso direito de ter raiva, xingar, pôr para fora, estará fora de cogitação. (Afinal, não somos humanos, somos "mestres iluminados").
"Esquece, é besteira"; "Deixa isso pra lá"; "Não se irrite com essas coisas"; "Tenha calma e seja compreensivo"; "Não deixe seu ego lhe dominar"... são as frases feitas mais ouvidas pelos terapeutas também humanos.
Como disse, nas horas de indignação das pessoas, é que tento ser o mais compreensiva e empática possível. Não fico com a crítica hipócrita da maioria, que só sabe jogar a culpa em quem está na lama... mas que quando o julgamento aponta para ela, são os outros é que estão errados.
Em geral, eu ouço, concordo, dou razão... simplesmente porque sei que nas horas da raiva ninguém consegue ser consciente de nada. É preciso nos lembrar que apenas após a tempestade é que vem a calmaria de se enxergar os fatos.
Mas todos querem parar a tempestade, e não exatamente, deixar ela passar. Pensam que não dando mais atenção ao indivíduo, a emoção perderá força. Ledo engano...
Tempestades são tempestades. O necessário a fazer, seria tentar não causar estragos por onde passamos. Algumas vezes são inevitáveis; outras não. O importante é o processo de desenvolvimento e conscientização. Mas a energia da chuva, dos raios, dos trovões e dos ventos precisarão ser direcionados e expressos.
A indiferença sua e dos outros pode muitas vezes aumentar o estrago e a força das emoções. Já, compreensão e paciência são os melhores antídotos para se acalmar alguém.
Aliás, é a indiferença e a negligência as grandes causadoras dos transtornos emocionais de hoje em dia.
Sigo sendo compreensiva, mesmo recebendo desprezos e ódios... Sigo ouvindo as pessoas, mesmo não sendo ouvida... Sigo paciente, mesmo não recebendo paciência... Sigo sendo presente, mesmo recebendo ausências...
Sigo, apesar de...
E não venham com conversinhas de que eu atraio aquilo o que eu sou. Jesus, Sócrates, e muitos outros sábios também receberam desprezo, humilhações, ingratidões e calúnias...
Então talvez eu esteja no caminho certo...
Tentando incorporar o "Perdoe a eles Senhor, pois não sabem o que fazem"... tropeçando, caindo, levantando... após pedras e mais pedras.
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